Naquele ano 1999 em que o povo de Timor pôde escolher o futuro e decidiu independência.
Mas que por isso mesmo, sofreu logo a seguir semanas de brutalidade e mesmo barbárie.
Tânia Bettencourt Correia era estudante finalista no curso de arquitetura na universidade de Lisboa. Tocada pelos relatos e pelas imagens que chegavam de Timor, Tânia e outros colegas do curso e também professores, todos gente com a convicção de que o lugar deles na vida é o de ajudar a mudar o mundo, intervir para tornar melhor a vida das pessoas, decidiram organizar-se para em modo de voluntariado – oferecer à reconstrução de Timor as competências que tinham desenvolvido na Faculdade de Arquitetura, a par da generosidade solidária.
Foi assim que ainda naquele terrível setembro de 99 nasceu na Faculdade de Arquitetura de Lisboa o gentil.
Tratando-se de gente que tem na ideologia a ação solidária, sem demoras, trataram de desenhar projetos concretos.
Pensaram que levantar as escolas, garantir bases para a educação seria uma prioridade, avançaram com projetos, calhou aliás uma marca suíça de relógios a anunciar que financiaria o levantamento de uma dessas escolas.
Num daqueles dias em que o grupo que incluía Tânia avançava no desenvolvimento dos projetos, eis que apareceu na Faculdade um homem que, como eles, cultivava a ação. Vinha ajudar à tomada de decisões, propunha uma escola para que a reconstrução avançasse de imediato.
E assim aconteceu, e logo a seguir a ação – avançar com o levantamento e reconstrução desta primeira escola na reconstrução de Timor.
Numa reunião do grupo na Faculdade de Arquitetura surgiu a questão – alguém aceita seguir já para Timor.
Tânia levantou o braço e avançou.
Acabou por ficar por 16 anos – vida dedicada à reconstrução de Timor, a trabalhar com Xanana Gusmão e o governo timorense, a fundar e desenvolver o arquivo e Museu da Resistência Timorense, a integrar a equipa que reconstruiu a casa do bispo, então Ximenes Belo, em Dili, também a casa das freiras em claro está tantas vezes a cooperar com o bispo Dom Basílio.
A arquiteta Tânia Bettencourt Correia, com a experiência de 16 anos de trabalho em ligação, com amizade, conta-nos como não há em Timor outra pessoa assim dedicada às pessoas, Dom Basílio era um Deus em que se podia tocar e que tocava no coração das pessoas, cuidava delas, protegia-as, com valentia, com dedicação máxima, até com astúcia.
É ainda Tânia quem nos relata o que Dom Basílio lhe contou como conseguiu garantir que a região de Baucau e Los Palos ficasse imune às cruéis ações terroristas.
Ele teve a sabedoria de armazenar todo o combustível da região para com ele ter um instrumento de troca para garantir que ali prevalecia a paz.
Assim, Dom Basílio do Nascimento recordado com emoção por quem pode testemunhar como ele era extraordinária pessoa humanam e um grande marco na historia contemporânea de Timor.Permito-me acrescentar: recordo tantas noites que ele passou em branco, ao telefone, dar-nos a entender a realidade de Timor, tantas horas inesquecíveis através da rádio, também a esclarecer os governantes portugueses, sei de longas e sucessivas conversas com o então presidente, recém-falecido, Jorge Sampaio.
Bispo Basílio do Nascimento (dir.) durante visita de Estado do ex-presidente da República, Jorge Sampaio, a Timor-Leste, de 10 a 15 de fevereiro de 2000. Source: Supplied/Franciso Sena Santos
Foi a seguir a uma dessas conversas que o presidente Sampaio reforçou contactos para que em urgência fosse convocado o Conselho de Segurança da ONU, o que permitiu que em poucas horas fosse ativada a UNTAET que veio a garantir a estabilização da segurança na terra então massacrada de Timor Leste.