Dói de facto ver o modo como foi tratada a arte criada nestes últimos 20 anos pelos artistas da Arte Moris, Arte Viva, de Timor.
O mais reconhecido líder histórico de Timor, Xanana Gusmão, declarou-se “muito triste” com o despejo do marcante coletivo artístico Arte Moris do espaço, de facto um centro de criação cultural, onde funcionavam há 20 anos. O despejo, com modos brutais, sucedeu por decisão das atuais autoridades timorenses.
Xanana no comentário a este caso chegou a usar a expressão “vandalismo” embora a seguir tenha optado por alguma moderação ao acrescentar que prefere não falar de vandalismo (neste caso, por parte das autoridades timorenses).
Um outro histórico construtor da independência de Timor, o Nobel da Paz José Ramos Horta também comentou com amargura e revolta a devastação numa brutal operação de despejo do coletivo Arte Moris, distinguido pela ONU com o prémio Direitos Humanos, Liberdade de Expressão.
Comentou José Ramos Horta:
“Este é um crime de lesa-arte que fica no currículo do atual governo de Timor".
Assim o primeiro comentário do Nobel da Paz de 96 José Ramos Horta ao modo como a polícia timorense executou nesta última quarta-feira a ordem de despejo do Centro Arte Moris, na periferia de Dili, na avenida que liga a capital timorense ao aeroporto.
Arte Moris, traduzindo do tétum quer dizer "Arte Viva", e aquele centro era isso – um lugar – vivo para a criação artística. De modo predominante pintura –em paralelo acolheu o teatro.
Mas mais do que isso, um lugar de integração de jovens de todo o território do país onde a maioria da população vive em miséria atroz e onde o desemprego é galopante.
Aquele edifício com amplo espaço interior -teto em abóbada – era um centro de artes praticamente desde a fundação da nação independente há 20 anos.
O edifício foi construído pelos indonésios no tempo da ocupação, precisamente como museu.
Mas que foi pilhado pelos próprios indonésios na debandada em setembro de 99.
A ONU, que liderou a transição para a independência de Timor, escolheu aquele edifício, com vasto terreno em volta para ali instalar o hospital das Nações Unidas.
Em 2002, quando a ONU saiu de Timor, um suíço e uma australiana que escolheram viver no país que estava a nascer, impulsionaram a instalação ali de um centro de artes para todos, com abertura a toda a gente
Dali saíram pintores como Maria Madeira, Edson Caminha ou Xisto da Silva.
Nesse discurso de 32 páginas, na Universidade de Kyoto, Xanana referiu-se mesmo precisamente à Arte Moris de Timor, com incitamento à parceria com a Escola de Artes na Universidade de Kyoto
Xanana defendeu uma nova civilização movida pela cultura artística e filosofia assente no respeito pelas pessoas e pela natureza.
Ora, a aspiração generosa enunciada por Xanana na Universidade de Kyoto e repetida em Lisboa não parece ser partilhada pelos atuais dirigentes políticos de Timor que decidiram despejar os artistas, os criadores do centro Arte Moris.
O movimento de solidariedade com as pessoas do Arte Moris cresceu nestes dias, também em Portugal, com a noção de que está em causa a criação artística contemporânea de Timor. A arte do nascimento e crescimento do país independente que em 99 tanto emocionou o mundo.