Os anos 20 do século XX: Que lições extrair para agora?

California, 1918, During 2nd Wave of Spanish Flu. “Wear a Mask or Go to Jail”

Source: Niday Picture Library

Confira na crônica do correspondente da SBS, em Lisboa, Francisco Sena Santos.


A década que se revelou prodigiosa para a criatividade – ficou conhecida como “os loucos anos 20”. Os anos 20 do século XX.

Foi o tempo do após duas terríveis desgraças: a primeira grande guerra e, depois, a pandemia de gripe espanhola. Uma e outra com o inferno de dezenas de milhões de mortos.

Passa agora um século – sobre o inicio daquele tempo que sucedeu a anos de terrível pesadelo. Agora, como há um século, tivemos o calvário – de que ainda não nos livrámos da pandemia de COVID-19 - dois grandes museus europeus, o Kunsthaus, museu de arte de Zurique, e o Guggenheim de Bilbao, lançaram-se à procura de extrair lições atuais daquele passado de há um século.

Agora – não tivemos uma guerra militar como então, mas tivemos a grande depressão da crise financeira de 2008 e tivemos – como então – a pandemia.

A exposição organizada pelos 2 museus mostra – o que há um século veio de novo -  a explosão de criatividade, o feminismo, o consumo, a vitalidade, a esperança, a excitação, os excessos, a grande libertação erótica associada ao forte impulso sexual, o hedonismo, a fúria de divertimento, o mundo vibrante de oportunidades, as bolsas em euphoria.

Mas também a implacável economia selvagem. Foi o tempo em que os filmes começaram a falar. As mulheres começaram, em alguns países, a ganhar direito a votar.

Mas também foi o tempo que abriu o caminho para que uma personagem tão ridícula como ameaçadora, Benito Mussolini tenha feito, com a marcha sobre Roma, a primeira grande mostra de força do fascismo.

E logo a seguir um austríaco, charlatão e pintor frustrado, de nome Hitler – entrou para devastar na cena política na Alemanha.

Ao mesmo tempo que um georgiano que ficou conhecido como Staline se serviu da revolução soviética.

Todos eles fizeram da vida de muitos milhões de pessoas um inferno e assentaram as bases para o mal maior alguma vez sofrido pela humanidade.

E tudo isto enquanto se dançava o cancan, o foxtrot e o charleston – e Paris era uma festa.

O que é que fica dessa década intensa em que todos os limites pareciam quebrados?

A exposição “Loucos anos 20” procura isolar e analisar as matrizes das revoluções estéticas e formais, bem como as revoluções sociais e económicas.

A exposição já esteve em Zurique, está agora e até meio de setembro, no Guggenheim de Bilbao, na Espanha.

As 300 peças que nos são mostradas estão ligadas sobretudo à Europa, privilégio para os anos 20 em Paris, Berlim, Zurique e Viena.

Começa com a evocação de traumas da grande guerra. Depois, abre-se ao design, à arquitetura, à fotografia –  à pintura, à escultura, à colagem, também a dança.

Vemos criações de Duchamp a Kandinsky, de Man Ray a Mondrian, de Breuer a Paul Klee e Brancusi, Le Corbusier, mas também Coco Chanel, Charlot, Fritz Lang, Josephine Baker ou Andre Breton.

Temos os anos 20 na Europa, a partir da ideia de novos modos de ver. Com papel protagonista da Bauhaus, a escola de arquitetura e artes aplicadas que promoveu o que é funcional, criação relativamente acessível do ponto de vista económico, e que assim revolucionou o design e a arquitetura.

É evidenciado o dominante desejo de novidade  – experimentar é a palavra de ordem naqueles loucos anos 20 , tempo de ruptura – avança a eletricidade, também a velocidade, com o automóvel, a rádio, o telefone, os primeiros eletrodomésticos.

A fechar a visita à exposição em Bilbao, os visitantes são convidados a um pé de dança ao ritmo de Charleston. Dançar – marcou aqueles anos 20 do século XX.

Uma festa interminável que levou ao auge do fomento de ódios. Tudo parecia possível e afinal aquela euforia – depois manipulada levou ao desastre.

Na exposição há quem nos lembre que agora para além do mais temos pela frente a emergência climática.


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