O rapper que se apresenta como Pablo Hasél tornou-se subitamente a figura com mais notoriedade na Espanha e o caso dele, com os distúrbios de rua, contínuos há 4 dias, é discutido na Europa como o último exemplo do problema de liberdade de expressão na Espanha.
Nos anos 60 e 70 do século XX, a liberdade de expressão era reclamada, então no tempo da ditadura do generalíssimo Franco, como liberdade de informar.
Hoje, a liberdade de expressão é reivindicado como direito a dizer tudo, até injuriar.
É o caso do rapper Pablo Hasél, catalão de Lleida: ele tem seguidores do posicionamento desafiador, provocador e mesmo injurioso que cultiva.
A letra das canções que compõe diz o que muitas vezes causa repulsa: defender um tiro na nuca de juízes ou políticos é uma violência que suscita toda a rejeição…
Mas Hasél cultiva ser assim hostil e tem seguidores.
Escreve no twitter ataques às instituições do estado espanhol, acima de tudo à casa real – à dinastia dos Bourbons, insulta Juan Carlos o rei que se retirou – chama-lhes fascistas, chega a enaltecer os métodos terroristas que a ETA e os Grapo usaram.
A justiça espanhola tomou o caso Hasél em mãos.
Julgou-o e condenou-a 9 meses e um dia de prisão, por injúrias à coroa e enaltecimento do terrorismo.
O tribunal deu-lhe até sexta-feira da semana anterior a esta última para se apresentar na cadeia para cumprir essa pena.
Hasél quis explorar o caso – para ampliar denúncia do sistema que rege o estado espanhol, e então entrincheirou-se, com dezenas de apoiantes, no edifício da reitoria da universidade da cidade dele, Llérida.
Hasél e os amigos queriam espetáculo e publicidade, mostraram tudo em diretos nas redes sociais.
Na passada terça-feira, os Mossos de Esquadra, a policia catalã, entrou na reitoria, cumpriu (com procedimento inquestionável) a ordem judicial, leu a Pablo Hasél a ordem de prisão – e foi entrega-lo à cadeia local. Com vários telemóveis a assegurar a transmissão de tudo – em direto pelas redes
Hasél era um desconhecido para a maioria – ficou cabeça de cartaz nas notícias – também é o que ele queria….ainda há-de estar mais satisfeito porque o caso dele está – continua a desencadear distúrbios – lamentavelmente já com vários feridos
Tudo neste caso é lamentável.
O que Hasél escreve – merece (certamente que da maioria de nós) a mistura de reprovação e desprezo.
Apetece deixá-lo a falar sozinho – sabendo que fala para a corte de fãs.
Mas fica evidenciado – o modo obsoleto - anacrónico como o código penal do estado espanhol trata a liberdade de expressão.
Há em Espanha líderes políticos e sociais condenados a penas pesadas – por levarem a aspiração de independência da Catalunha – à iniciativa de avaliação de vontades numa consulta popular que – é facto – a legislação espanhola, ao contrário da de outras democracias, também não consente.
Agora, há um artista anti-sistema, Pablo Hasél, que por dar voz a insultos ao sistema é condenado a 9 meses e um dia de prisão.
É uma condenação que está a dar ao condenado a notoriedade que não tinha e que está a revoltar tanta gente em protestos.
Muita gente, certamente a maioria, condena – como é óbvio – o ódio que está nas palavras de Hasél, mas também tem noção – da desproporção da severa retaliação penal traduzida em privação da liberdade.
Está em causa um conceito fundamental há 3 séculos nas sociedades plurais, democráticas – o da liberdade de expressão: está reconhecido que é um conceito com conjugação complexa com o respeito pela dignidade do outro.
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já lembrou à Espanha, num outro caso, que a queima de fotografias do rei não é punível com pena de prisão.