Pablo Hasél: o rapper catalão que está a sacudir a Espanha

Pablo Hasel during a press conference in Lleida, Catalonia, Spain, 1 February 2021.

Source: EFE

Confira a crônica desta semana do correspondente da SBS, em Lisboa, Francisco Sena Santos.


O rapper que se apresenta como Pablo Hasél tornou-se subitamente a figura com mais notoriedade na Espanha e o caso dele, com os distúrbios de rua, contínuos há 4 dias, é discutido na Europa como o último exemplo do problema de liberdade de expressão na Espanha.

Nos anos 60 e 70 do século XX, a liberdade de expressão era reclamada, então no tempo da ditadura do generalíssimo Franco, como liberdade de informar.

Hoje, a liberdade de expressão é reivindicado como direito a dizer tudo, até injuriar.

É o caso do rapper Pablo Hasél, catalão de Lleida: ele tem seguidores do posicionamento desafiador, provocador e mesmo injurioso que cultiva.
A letra das canções que compõe diz o que muitas vezes causa repulsa: defender um tiro na nuca de juízes ou políticos é uma violência que suscita toda a rejeição…

Mas Hasél cultiva ser assim hostil e tem seguidores.

Escreve no twitter ataques às instituições do estado espanhol, acima de tudo à casa real – à dinastia dos Bourbons, insulta Juan Carlos o rei que se retirou – chama-lhes fascistas, chega a enaltecer os métodos terroristas que a ETA e os Grapo usaram.

A justiça espanhola tomou o caso Hasél em mãos.

Julgou-o e condenou-a 9 meses e um dia de prisão, por injúrias à coroa e enaltecimento do terrorismo.

O tribunal deu-lhe até sexta-feira da semana anterior a esta última para se apresentar na cadeia para cumprir essa pena.

Hasél quis explorar o caso – para ampliar denúncia do sistema que rege o estado espanhol, e então entrincheirou-se, com dezenas de apoiantes, no edifício da reitoria da universidade da cidade dele, Llérida.

Hasél e os amigos queriam espetáculo e publicidade, mostraram tudo em diretos nas redes sociais.

Na passada terça-feira, os Mossos de Esquadra, a policia catalã, entrou na reitoria, cumpriu (com procedimento inquestionável) a ordem judicial, leu a Pablo Hasél a ordem de prisão – e foi entrega-lo à cadeia local. Com vários telemóveis a assegurar a transmissão de tudo – em direto pelas redes

Hasél era um desconhecido para a maioria – ficou cabeça de cartaz nas notícias – também é o que ele queria….ainda há-de estar mais satisfeito porque o caso dele está – continua a desencadear distúrbios – lamentavelmente já com vários feridos

Tudo neste caso é lamentável.

O que Hasél escreve – merece (certamente que da maioria de nós) a mistura de reprovação e desprezo.

Apetece deixá-lo a falar sozinho – sabendo que fala para a corte de fãs.

Mas fica evidenciado – o modo obsoleto - anacrónico como o código penal do estado espanhol trata a liberdade de expressão.

Há em Espanha líderes políticos e sociais condenados a penas pesadas – por levarem a aspiração de independência da Catalunha – à iniciativa de avaliação de vontades numa consulta popular que – é facto – a legislação espanhola, ao contrário da de outras democracias, também não consente.

Agora, há um artista anti-sistema, Pablo Hasél, que por dar voz a insultos ao sistema é condenado a 9 meses e um dia de prisão.

É uma condenação que está a dar ao condenado a notoriedade que não tinha e que está a revoltar tanta gente em protestos.

Muita gente, certamente a maioria, condena – como é óbvio – o ódio que está nas palavras de Hasél, mas também tem noção – da desproporção da severa retaliação penal traduzida em privação da liberdade.

Está em causa um conceito fundamental há 3 séculos nas sociedades plurais, democráticas – o da liberdade de expressão: está reconhecido que é um conceito com conjugação complexa com o respeito pela dignidade do outro.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já lembrou à Espanha, num outro caso, que a queima de fotografias do rei não é punível com pena de prisão.


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