A história de Noah, um menino com dois anos e oito meses que andou perdido no mato e na floresta durante 35 horas sobreviveu sem o apoio de nenhum adulto.
Mobilizaram-se aliás centenas de adultos e grande contingente de forças seguranças com cães pisteiros que, noite e dia tentaram encontrá-lo.
Veio a ser encontrado, sem roupa, com naturais arranhões no corpo, sobretudo nos pés, ao começo da noite de quinta-feira num local que, embora em linha reta a 4 quilómetros de casa, obriga a um percurso de 10 quilómetros para superar os intransponíveis obstáculos.
É uma extraordinária história de sobrevivência de uma criança com 32 meses e – ficou provado – notável autonomia.
O alerta para o desaparecimento de Noah foi dado às 8 da manhã de quarta-feira.
Noah vive com os pais e uma irmã numa moradia no interior florestal de Portugal, 250 quilómetros para nordeste de Lisboa.
O pai sai todos os dias entre as 5 e as 6 da manhã para trabalhos no campo. A mãe, por volta das 7 da manhã, quando acordou, verificou que o filho Noah não estava em casa.
Chamou-o, não há casas por perto, procurou nos bosques em volta e, ao fim de uma hora pediu ajuda à polícia.
Na aldeia mais próxima, Proença-a-Velha, as mais de 60 pessoas que lá vivem e que têm agilidade para buscas na floresta, meteram-se ao caminho para ajudar na procura.
A meio da tarde já tinham sido acionados drones para participar nas buscas e uma equipa de mergulhadores dos bombeiros iniciou buscas num ribeiro que passa perto.
Por toda a noite, centenas de pessoas procuraram Noah.
Ao começo da manhã do dia seguinte, 24 horas depois do desaparecimento, baixaram as esperanças de virem a encontrar Noah com vida. Apesar de estarmos à beira do verão, a noite foi fria e chuvosa.
Cresceram especulações: Noah poderia ter sido raptado. Ou teria caído nalgum poço ou no rio e já não estaria a salvo. Isto porque toda a zona nos 3 quilómetros em volta de casa tinha sido pesquisada.
A essa hora, também já havia gente ida de longe para ajudar nas buscas.
Havia quem especulasse nas redes sociais com cenários maldosos: que o pai poderia ter vendido a criança; ou até que poderiam tê-la morto e escondido.
Veio para as conversas o caso de Maddie McCann, a menina britânica desaparecida no Algarve em maio de 2003 e que, 17 anos depois, continua sem se saber ao certo o que lhe aconteceu.
Mas o comando das forças de polícia mandou que o esforço de busca continuasse e até fosse intensificado. Alargaram o perímetro de busca.
Cerca das 10 da manhã encontraram a cadela que acompanha sempre o Noah. Estava parada numa margem da ribeira. Ora, sabendo-se que a cadela estava sempre onde Noah estivesse, cresceu o receio de Noah ter sido levado por algum rápido na corrente da ribeira.
A suspeita cresceu ao terem sido a seguir encontradas as roupas e as galochas de borracha do Noah.
Mas ainda de manhã a polícia de investigação detetou, pelos vestígios, que a cadela tinha tentado passar uma vedação mas não conseguiu, enquanto o Noah tinha conseguido, percebia-se pelas pegadas. A cadela tem corpo que é maior do que o de Noah.
A mãe recordou que a família vai muitas vezes para o rio e que o Noah gosta de ir nu para a água que ali tem altura de uns 30 centímetros.
O comando da polícia pediu às equipas de resgate, várias a cavalo, também cães, que ampliassem a busca para o raio de 15 quilómetros.
Houve quem reclamasse que isso não faria sentido, mas foi o que aconteceu.
Ao fim da tarde, muito perto das 20 horas (nesta época no hemisfério norte ainda é dia) Noah foi encontrado, meio adormecido, nu junto a uma árvore, no tal lugar longe de casa – um lugar que obriga a percorrer 10 quilómetros para lá chegar.
Noah tinha escoriações nos pés e arranhões de vegetação no corpo, é natural, mas parecia bem, não havia sinais de lhe ter sido feito algum mal.
As equipas médicas, incluindo pediatria imediatamente foram mobilizadas para junto do Noah, que se levantou a sorrir quando o pai chegou junto dele, logo a seguir a mãe que vinha com outra das equipas de resgate.
Noah começou por querer água, quis comer, dava a impressão de para ele, tudo ser normal, exceto a tanta gente em volta dele, embora a polícia tivesse criado uma zona de não acesso em volta dele.
Sob assistência dos médicos, Noah foi levado para o serviço de pediatria do hospital de Castelo Branco, onde foi confirmado que tudo está bem.
A polícia atesta que não houve negligência por parte dos pais. Eles cultivam para os filhos a educação na natureza e isso explica que Noah, com apenas 2 anos e 8 meses de vida, tenha resistido 35 horas, autónomo, na natureza.
Pedopsiquiatras e psicólogos explicam que tem de haver um grande nível de desenvolvimento motor e psicológico para fazer o que esta criança aparentemente terá feito
Os pais são um casal peculiar com uma história de vida fora do comum. Conheceram-se em Lisboa. Ela trabalhava na área do audiovisual e ele era chefe de cozinha.
Em 2013 decidiram viajar pela Europa numa carrinha de 1984, movida unicamente a óleo vegetal usado. Queriam promover a ideia de um planeta “sustentável”.
Um estilo de vida que chegaram a relatar num blogue. Contaram que durante cinco anos andaram pelo sul da Europa, em voluntariado, e que chegaram até à Turquia.
Depois instalaram-se na Grécia, no ReGreen, um projecto europeu dedicado à economia verde, para concretizar “o sonho de transitar para um modo de vida mais ecológico e conectado à natureza”.
A filha mais velha, que tem agora 6 anos, nasceu durante este percurso. Contam como se dedicaram à agricultura e que viveram em tendas, quartos, casas, apartamentos, hospitais e na carrinha amarela. Até que decidiram voltar de malas e bagagens para Portugal e instalaram-se na Beira Baixa.
A casa que fizeram está instalada a um quilómetro da aldeia de Proença-a-Velha, em terreno acidentado, com muros de pedra, entre oliveiras, pinheiros, mato e sobreiros. Os acessos são de terra batida e a quinta fica a escassos metros de um curso de água que faz um cotovelo com rápidos.
Noah aprendeu a viver na natureza - é a chave para que esta história tenha desfecho feliz.