Com a pandemia da COVID-19, para evitar o risco de que o vírus entrasse e se espalhasse pelo país, a Austrália foi uma das primeiras nações a adotar a medida de fechar suas fronteiras para a entrada de portadores de vistos temporários, incluindo turistas e estudantes internacionais, no dia 20 de março de 2020.
A Austrália também foi um dos países que permaneceu por mais tempo com as fronteiras fechadas, e com controle da entrada do número de residentes permanentes e cidadãos.
No dia 22 de novembro de 2021, o governo federal anunciou que reabriria o país para a entrada de pessoas completamente vacinadas com vistos temporários elegíveis, incluindo trabalhadores qualificados e estudantes internacionais, mas ainda não turistas, em 1° de dezembro.
O anúncio foi comemorado por muita gente que passou mais de 20 meses aguardando para viajar para a Austrália. Mas uma semana depois, no dia 30 de novembro, um outro anúncio preocupou essas pessoas: por causa do surgimento da variante ômicron da COVID-19, o governo federal adiou a reabertura das fronteiras de 1° para 15 de dezembro.
No período de quase 21 meses de fechamento das fronteiras, mais de 150 mil portadores do visto de estudos australiano ficaram ‘presos’ fora do país sem poder voltar. E aqueles que no começo de 2020 já estavam em processo de planejamento ou preparativos para partir para a Austrália como estudantes, tiveram que adiar o projeto e lidar com uma longa espera. Alguns desistiram, outros escolheram novos destinos, mas houve aqueles que aguardaram e que agora estão diante da possibilidade real de embarcar para fazer um intercâmbio na Austrália.
É o caso da Monica Xavier, mineira que já planeja um intercâmbio na Austrália desde o começo de 2020 e iniciou em novembro de 2021 ainda no Brasil, de forma remota, uma pós-graduação em uma instituição de ensino Australiana. Com o visto de estudos aprovado e em mãos, comprou a passagem aérea para embarcar no dia 15 de dezembro para a Austrália, a data exata de reabertura do país.
Por que estudar na Austrália
Monica conta que já queria morar em um outro país havia algum tempo. Ela já tinha estudado for a três vezes, em 2012, 2013 e 2018, nos EUA. Em 2018 ela foi para Nova Iorque pensando em avaliar melhor a cidade para ver se gostaria de passar um tempo maior lá, mas chegou à conclusão de que aquele não era o destino que ela buscava.De volta ao Brasil, ela se encontrou com um amigo que morava em Melbourne, e quando ele descreveu as características da capital de Victoria, ela achou que poderia gostar de morar na segunda maior cidade da Austrália.
Monica em Nova Iorque, em uma das vezes em que foi estudar nos EUA. Ela chegou a pensar em ficar um período maior lá, mas se identificou mais com a Austrália. Source: Supplied
Ela então pesquisou mais sobre a cidade e teve a oportunidade de visitar Melbourne. “Eu me encantei pelo país, e aí comecei a fazer meu planejamento para me mudar para a Austrália para estudar. Eu pretendia começar meus estudos em julho de 2020, mas com a pandemia, não pude ir”.
Eu me encantei pelo país e comecei a planejar de me mudar para a Austrália para estudar. Eu pretendia começar meus estudos em julho de 2020, mas com a pandemia, não pude ir.
De lá pra cá, Monica foi mudando seus planos, que a princípio eram de fazer um mestrado, mas com algumas barreiras encontradas nas universidades com as quais ela fez contato em Melbourne e a impossibilidade de viajar para o país durante o período de fechamento das fronteiras, terminaram com Monica se matriculando em uma pós-graduação numa outra instituição da cidade, onde ela começou o curso de forma remota em novembro de 2021.
“No meio do ano de 2021 eu optei por essa estratégia arriscada de começar uma pós-graduação de forma remota, sem ter certeza de quando as fronteiras iriam reabrir, pois eu já queria estar com o visto de estudos para embarcar assim que fosse possível”.
Falta de informações e de perspectiva
Para Monica, fazer o planejamento para estudar na Austrália foi muito difícil porque o governo não diculgava datas previstas para a permissão de entrada de estudantes no país. “Outros países abriram muitos antes da Austrália para estudantes internacionais”.
A entrevista com a Monica foi gravida no dia 8 de dezembro, e ela disse que ainda não tinha certeza se conseguiria embarcar no dia 15 de dezembro porque a data já tinha sido adiada uma vez depois do anúncio inicial de reabertura no dia 1°.
“É difícil você se planejar quando o governo não te dá informações precisas. Minha passagem era para sair do Brasil no dia 13 e chegar na Austrália no dia 15 de dezembro, mas eu fiquei apreensiva de adiarem mais uma vez, então troquei para sair do Brasil dia 15 e chegar na Austrália dia 17”. Monica achou melhor viajar já sabendo se algum estudante internacional chegou na Austrália antes dela e conseguiu entrar no país.
Outros países abriram muitos antes da Austrália para estudantes internacionais. É difícil você se planejar quando o governo não te dá informações precisas.
Monica também destaca que reservar hospedagem foi algo praticamente impossível já que ela não tinha uma data exata de entrada no país por causa da incerteza e depois da mudança na data de reabertura.
Ela diz ainda que nos últimos meses o governo passou a fornecer mais informações para estudantes internacionais, mas que até meados de 2021 não se falava no retorno de estudantes ao país e que as pessoas que queriam estudar na Austrália ou retornar ao país como estudantes ficaram “no escuro” por muito tempo.
Monica destaca que países como EUA, Canadá e Irlanda, que também recebem muitos estudantes internacionais todos os anos, ofereceram mais suporte aos estudantes, com mais rapidez e precisão nas informações divulgadas a esse público.
“Na Austrália foi sempre tudo muito incerto, o que tornou mais difícil a longa espera. Eu foquei muito nas razões de eu ter escolhido a Austrália para o meu intercâmbio, porque no meio do caminho me deu vontade de escolher outro país para viver essa experiência”.
Lidar com o longo período de espera
Sobre como foi lidar com a incerteza da reabertura das fronteiras e a espera, Monica diz que passou por fases diferentes durante esse longo período. Ela conta que porque já estava com tudo planejado antes da pandemia e teve que adiar os planos para uma data incerta, foi bem frustrante.“Eu cheguei a me questionar sobre manter meu projeto de intercâmbio para a Austrália. Mas aí eu fiz uma lista com os motivos de morar e estudar no país, e era realmente o que eu queria. Era só uma questão de tempo. Mas o tempo foi muito maior do que eu imaginava”.
Monica em Melbourne, quando esteve na cidade à passeio, se encantou pelo lugar e decidiu que faria um intercâmbio mais longo na Austrália. Source: Supplied
Eu cheguei a me questionar sobre manter meu projeto de intercâmbio para a Austrália. Mas aí eu fiz uma lista com os motivos de morar e estudar no país, e era realmente o que eu queria.
Monica é funcionária pública e tirou uma licança de dois anos do trabalho para fazer o intercâmbio, mas com a impossibilidade de viajar, a licença iria expirar caso ela não embarcasse o quanto antes. Por isso ela tomou a decisão de se matricular e começar o curso de forma remota para, assim que as fronteiras abrissem, já com o visto de estudante em mãos, ela pudesse partir para a Austrália.
Segundo Monica, algo que a ajudou a lidar com a longa espera foi fazer cursos de autoconhecimento. “Isso me trouxe mais calma. Me conhecer melhor para saber o que eu realmente quero e aprender a ter a pacieência de esperar o tempo, que nem sempre é o tempo que a gente quer”.
Dificuldade de fazer reservas
Quando um estudante planeja o intercâmbio, geralmente compra passagens aéreas com antecedência e fecha um contrato de ao menos duas semanas a um mês de acomodação no país de destino.
No caso da Monica, ela comprou as passagens para embarcar em julho de 2020 para a Austrália, mas a Latam, companhia aérea escolhida por ela, passado um período do fecahmento das fronteiras do país, cancelou as passagens, oferecendo a possibilidade de remarcação até 31 de dezembro de 2021.
Quando Monica viu que a Latam ainda não tinha retomado os voos que fazem a rota do Brasil até a Austrália, ela decidiu então pedir o reembolso da tarifa e comprar os bilhetes por outra companhia aérea.
Já sobre acomodação, Monica conta que era impossível reservar um lugar para ficar assim que chegasse antes de ter as datas definidas. “Minha sorte é que eu tenho um amigo em Melbourne e posso ficar por um período na casa dele. Por isso eu quero fazer quarentena em hotel. Até porque o AirBnb que eu tentei alugar não aceita pessoas que vão fazer quarentena”.
Minha sorte é que eu tenho um amigo em Melbourne e posso ficar por um período na casa dele, já que eu não tinha como alugar um lugar sem saber a data exata em que chegaria.
A quarentena, que não seria exigida para viajantes internacionais totalmente vacinados, voltou a ser exigida depois do surgimento da variante ômicron, mas não é preciso ser feita em hotel, é é mais curta do que os 14 dias exigidos anteriormente. O período solicitado agora é de 72 horas.
Monica não chegou a ter grandes prejuízos com as remarcações de passagens que teve que fazer, mas teve um gasto extra no cancelamento das passagens aéreas dentro do Brasil, já que mora no interior de Minas Gerais e tem que ir até São Paulo para embarcar no voo internacional. Ela teve também que pagar a diferença do valor da tarifa do voo internacional, já que a Qatar, companhia aérea pela qual ela vai do Brasil para a Austrália, não está cobrando taxa de remarcação mas cobra a diferença na tarifa, que muda de acordo com a data do voo.
Notícia da reabertura das fronteiras
Perguntada sobre como recebeu no dia 22 de novembro a notícia de que as fronteiras da Austrália iriam reabrir no dia 1° de dezembro para estudantes internacionais e outros portadores de vistos temporário, Monica diz que ficou alegre com o anúncio do governo.
“No dia mesmo eu fiquei muito feliz. Eu não acreditava, porque o anúncio foi feito muito próximo da data de reabertura. Mas aí, logo depois veio o balde de água fria, com o anúncio do adiamento da data”.
Eu fiquei muito feliz com a anúncio do governo australiano de reabertura das fronteiras. Mas aí, logo depois veio o 'balde de água fria', com o novo anúncio do adiamento da data.
De fato, no dia 30 de novembro o governo australiano anunciou que adiaria a reabertura do país para 15 de dezembro por causa do surgimento da variante ômicron, e da incerteza sobre a gravidade da nova cepa.
Com esse segundo anúncio, Monica achou melhor adiar a passagem que já tinha comprador desde outubro, quando o visto de estudos dela foi aprovado, para embarcar no dia 13 de dezembro e chegar na Austrália no dia 15.
“Foi um tiro no escuro mas eu me baseei no plano de reabertura que já tinha sido anunciado pelo governo, sem datas específicas, mas baseado no índice de vacinação da população, e com a projeção de que a meta deveria ser atingida em novembro”.Com o adiamento da reabertura das fronteiras em duas semanas, Monica adiou apenas em dois dias o seu bilhere aéreo, para embarcar no dia 15 de dezembro, a data da reabertura, só para ter certeza de que sairia do Brasil sabendo que poderia entrar na Austrália, baseada na experiência de outros estudantes que chegariam antes dela.
Quando o governo da Austrália anunciou o adiamento da reabertura das fronteiras, Monica mudou a data das passagens aéreas dela, com medo de um novo adiamento. Source: Supplied
“Se eu saísse do Brasil dia 13 e o governo anunciasse em cima da hora que adiaria mais uma vez a data, eu correria o risco de ficar ‘presa’ em um dos meus destinos de conexão, o Catar ou a Malásia. Então eu achei melhor esperar um pouco, porque ficar ‘presa’ no Brasil é mais tranquilo do que no exterior”.
Preparativos para o embarque e expectativa
Sobre os preparativos para a viagem, que agora estyá muito próxima de acontecer, Monica diz que já está com quase tudo pronto, mas que ainda está com o ‘pé atrás. “Eu penso: será que eu vou mesmo? Ainda tem aquela incerteza. Eu falo que essa minha viagem é com emoção porque já houve várias mudanças durante o planejamento”.
Mesmo assim, Monica diz estar otimista. “Eu acho, pelo que tenho lido e me informado, que o governo não vai mais adiar a reabertura das fronteiras. Só se algo muito drástico acontecer no meio do caminho. Eu já estou com 80% de tudo pronto pra embarcar”.
Eu acho, pelo que tenho lido e me informado, que o governo não vai mais adiar a reabertura das fronteiras. Eu já estou com 80% de tudo pronto pra embarcar.
“Eu espero crescer como pessoa, ir atrás de novos desafios profissionais, curtir e ser feliz enquanto estiver em Melbourne. A cidade é muito receptiva. Acho que vai ser uma experiência muito enriquecedora para a minha vida”.
Ao falar da longa e espera até esse momento de poder embarcar para o intercâmbio na Austrália, Monica diz que acredita que soube aproveitar essa espera da melhor forma, se preparar para o próximo passo e que acredita que vai conseguir ‘colher frutos’ dessa espera.
“Apesar de ter sido desafiador, frustrante muitas vezes, de ter tido vontade de desistir muitas vezes, eu foquei no meu objetivo principal e tentei aproveitar esse período de espera a meu favor”.
Apesar de ter sido desafiador, frustrante muitas vezes, de eu chegar a ter tido vontade de desistir, eu foquei no meu objetivo principal e tentei aproveitar esse período de espera a meu favor.
Intercâmbio pós-pandemia
Perguntada sobre como a pandemia vai influenciar no intercâmbio dela, Monica diz que nesse período ela parou para pensar sobre o que ela realmente quer para a sua vida.
“Antes eu vivia muito no ‘automático’ e não parava para pensar nas coisas. A pandemia veio ratificar a minha decisão de morar fora, de mudar de carreira. Eu parei mais para pensar e tive mais certeza da mudança”.