Ainda antes das 7 da manhã, Constâncio, vindo da cidade universitária de Coimbra, 200 quilómetros para norte de Lisboa, já estava à porta da embaixada timorense, local de voto em Lisboa, estrategicamente colocada frente ao rio Tejo, a 100 metros do imponente Mosteiro dos Jerónimos e a outros tantos da famosa casa dos Pastéis de Belém, natas, ovos e farinha em mistura fina e tudo coberto com canela.
Constâncio, com um boné de Timor a aconchegar a cabeça em manhã fria estava orgulhoso por ir votar para o futuro do país.
Logo na primeira hora apareceram para votar timorenses mais antigos.
Os mais novos apareceram mais para a hora de almoço e muitos esperaram num murete frente à Embaixada pela contagem de votos.
Muitos com o telemóvel na mão á espera de resultados.
Os primeiros foram os da Austrália, Ramos Horta na frente.
Houve logo quem afiançasse que o voto na Austrália seria uma amostra do voto final desta primeira volta: Ramos Horta na frente lançado para a reeleição mas obrigado a segunda volta com Lu-Olo que não chega aos 30%.Depois, começaram a aparecer dados de Timor, com confirmação da tendência.
Quase um milhão de timorenses votaram nessas eleições Source: AAP
Às 3 da tarde fecharam as portas da assembleia de voto em Lisboa, perto das 4 começou a contagem perante umas 70 pessoas.
Havia quem lamentasse que em Lisboa só tivessem votado 227 dos 750 eleitores inscritos.
É um facto que alguns chegaram depois da hora.
Começada a contagem com cada voto a ser exibido perante os presentes, logo se percebeu que Ramos Horta avançava destacado.
A irmã, Licínia, apontava números num caderno sobre o colo. Contados os primeiros 15 votos, Ramos Horta recebia 7, Milena Pires tinha 4 e Lu-Olo, 3.
Aqui e ali incidentes na decisão sobre um voto. Houve 3 casos em torno de boletins que tinham rasgões.
Prevaleceu a interpretação de que o voto estava claramente expresso no longo boletim de voto e que o rasgão era resultado da fenda estreita à entrada na urna.
A meio da votação, estava claro que Ramos Horta ia ser o mais votado, destacado.Havia então luta cerrada entre Milena e Lu-Olo pelo 2º lugar. Na sala havia quem apostasse que a próxima eleição será a de mudança de geração política em Timor e vai ser a vez de Milena, que tinha a segunda claque mais ativa, depois da dos apoiantes de Ramos Horta – com alguns a dizerem que estão com Horta por ele ser o candidato de Xanana.
Jose Ramos Horta conta com a preferência dos eleitores timorenses no exterior Source: AP
Mas na contagem da segunda metade dos votos em Lisboa houve uma vaga a favor de Lu-Olo.
Pelo meio apareceu um voto na candidata Berta dos Santos. Veio a ser o único nesta candidata com credenciais de topo no atual governo timorense. Houve quem soltasse uma gargalhada.
Lu-Olo continuou a ganhar terreno sobre Milena.
No final da votação em Lisboa, 82 votos para Ramos Horta, 67 para Lu-Olo, 47 para Milena. Lere, com 13 votos, ficou num distante 4º lugar.Quatro dos candidatos não tiveram qualquer voto em Lisboa. Dois tiveram apenas um.
Jose Ramos-Horta, ex-presidente, e Francisco Lu-Olo Guterres, atual líder, devem ir para um segundo turno Source: EPA/ANTONIO DASIPARU / AP Photo/Lorenio Do Rosario Pereira
Entretanto também estavam apurados os resultados finais no Porto.
Contas feitas ao voto timorense em Portugal, 125 votos (39,4%) para Ramos Horta, 93 (29,3%) para Lu-Olo, 58 (18,3%) para Milena Pires, 17 (5,3%) para Lere Anan.
Contados os votos seguiram-se as análises na rua. Somados os resultados parciais de Timor com os da Austrália, Coreia do Sul e Portugal, verificada a tendência constante, era muito comentado que o conjunto de candidatos com ligação à Fretilin não somava tanto quanto o conseguido por Ramos Horta.
E ouviu-se gente de Milena a garantir que pelo menos parte substancial do voto nela vai, na 2ª volta, para Ramos Horta. Alguém comentou: “nem um irá para o Lu-Olo”.
Ninguém parece duvidar que Ramos Horta já está com um pé à frente para regressar à Presidência da República Democrática de Timor Leste.
Também se ouviu quem dissesse ser inevitável a antecipação das eleições legislativas de 2023 já para os próximos meses.
Uma voz experiente chamava a atenção para o facto de o poder real em Timor estar na mão do primeiro-ministro. O nome de Xanana foi muito mencionado nesta discussão. Quem falou em Milena foi logo contestado, “porque ela não tem partido”. Essa voz rendeu-se com um “fica para a próxima eleição presidencial”.
Mas aí ainda se ouviu outra voz: a Milena teve boa votação em Portugal mas em Timor o 3º lugar “é da Berta e lá a Milena é residual”. Balde de água fria sobre os apoiantes de Milena, com a discussão a continuar já por entre o som dos altifalantes que amplificavam a voz de Chico Buarque a cantar Tanto Mar, com a letra que diz “Foi bonita a festa pá, fiquei contente, ainda guardo renitente um velho cravo para mim”
Para já, falta apurar o resultado do duelo eleitoral entre Ramos Horta e Lu-Olo. Há um claro favorito mas a decisão cabe aos eleitores timorenses, daqui a um mês