A vida moderna é cara, e para aqueles que moram em Sydney e nos arredores, onde os valores de moradia e o custo de vida são mais altos do que a média australiana, arcar com esses custos pode ser difícil.
O governo australiano gasta mais do que A$180 bilhões por ano em auxílios financeiros a pessoas desempregadas e com necessidades específicas. Esse valor é maior do que os gastos com saúde, educação e defesa somados. Pode parecer um alto investimento, mas fica aquém de atender às necessidades de milhares de australianos que precisam desses auxílios para sobreviver.
É o que descobrem no documentário da SBS em três episódios a parlamentar do Partido Verde pelo estado de NSW, Jenny Leong, o jornalista Caleb Bong e a escritora e personalidade da TV, Julie Goodwin.
Na série, Jenny, Caleb e Julie participam de diferentes jornadas imersivas para viver na pele o dia-a-dia das pessoas que recebem benefícios do governo em três comunidades distintas. Eles tem que sobreviver com os pagamentos do governo. Não apenas para comprar os itens denecessidade básica e pagar as contas, mas também pagar por moradia e tomar decisões difíceis para quem tem orçamento baixo.
Cada um deles tem uma razão bem diferente para participar do experimento de nove dias. Para Julie, é a memória da sua própria luta para se sustentar quando era mais jovem que a leva a querer desvendar um pouco do estigma do desemprego.
No caso de Jenny, é a crença dela de que mais deve ser feito para ajudar os desfavorecidos, e que "ninguém deveria ser pobre demais para poder viver". Como muitos australianos, Caleb tem sido franco em suas críricas ao sistema de auxílio financeiro do governo à população necessitada, e chegou a comparar a dependência de quem recebe os auxílios à dos usuários de heroína. Mas ele se dispôs a ter sua perspectiva desafiada e a ouvir o que as pessoas na linha de pobreza tem a dizer.No começo da jornada deles, cada um abre mão de qualquer acesso ao seu estilo de vida atual e deixam o conforto de suas casas para ir a três diferentes localidades onde eles vão passar pouco mais de uma semana vivendo na linha de pobreza: uma comunidade no centro da cidade, os bairros mais afastados e o interior do estado. É uma experiência de confronto para os três e eles ficam visivelmente chocados com pelas circunstâncias em que se encontram.
A parlamentar do Partido Verde pelo estado de NSW, Jenny Leong, durante o documentário 'Could you survive on the breadline?' que estreia hoje na SBS. Source: SBS
Caleb vai viver no centro da cidade recebendo um pagamento para pessoas com deficiência, em que o máximo para um adulto soxinho é de A$868 por quinzena, e testemuunha os sacrifícios que precisam ser feitos para garantir que cada dólar tenha valor. Julie tem um orçamento de A$40 por dia pela pensão do JobSeeker, e descobre os desafios de morar em uma acomodação de emergência no sudoeste de Sydney. A jornada de Jenny é fora de Sydney, na região de Illawarra, e a leva a entender o quanto é crítico o programa de alojamento para uma mãe solo que vive do auxílio do governo.
À medida em que a série se desenvolve e cada um dos três participantes fica imerso na vida de luta dessas pessoas por sobrevivência, os impactos reais da diferença social vão sendo mostrados.Em 2020, havia 3.24 milhões de pessoas (13.6% da população australiana) vivendo abaixo da linha de pobreza. A Organização para a Cooperação e o DEsenvolvimento Econômico (OCDE) define a linha de pobreza como metade da média de rendimento da população total, o que na Austrália corresponde a A$457 por semana para um adulto que vive sozinho. É preocupante então constatar que o JobSeeker para um adulto sem filhos hoje gira em torno de A$310 por semana. Acrescente a isso as dificuldades trazidas pela pandemia, e as perspectivas para muitas pessoas que dependem desses pagamentos são bem ruins.
'Could You Survive On The Breadline?' Source: Distributor
É difícil não se emocionar ao saber dos efeitos da constante incerteza e instabilidade na vida dessas pessoas. Jenny, Caleb e Julie ficam mais determinados a encontrar formas de resolver o problema. Emprego é obviamente o começo de tudo, mas à medida em que cada um dá início à sua própria busca, eles se desanimam com a falta de oportunidades, e a tentativa de reaolver o problema rapidamente mostra que há uma desinformação sobre o assunto. Esse é um problema de longo prazo que requer uma solução a longo prazo. Uma abordagem generalizada, como se todos fossem iguais ou tivessem as mesmas oportunidades, não cabe aqui.
Quanto mais os participantes ouvem as pessoas generosas que os deixaram participar de suas vidas, mais se torna claro que, como nação, há uma atitude problemática dentro da nossa sociedade de assumir que é fácil deixar de depender dos auxílios do governo. A crença de que todos somos auto-suficientes se mostra equivocada em vários momentos no decorrer da série.
E há um senso real de que as pessoas que se encontram nas situações mostradas no documentário poderiam ser qualquer um de nós. As histórias que eles compartilham revelam que uma perda de trabalho inesperada, uma doença crônica ou um relacionamento violento podem transformar uma vida de relativo conforto em uma vida de pobreza e dependência dos auxílios do governo. Quando se acrescentam as barreiras que acompanham deficiências, falta de oportunidades e estigmas, deixar de depender dos pagamentos do governo se torna uma tarefa muito mais complexa e desafiadora do que a maioria de nós pode imaginar.
A série é um importante lembrete de que existem pessoas reais por trás das estatísticas, e que a habilidade de uma pessoa com privilégios tomar decisões conscientes sobre a que as pessoas desfavorecidas devem ter acesso é, no mínimo, limitada. O encontro individual de Jenny, Caleb e Julie no decorrer dessa experiência vai te inspirar, te desafiar e te fazer se questionar sobre se é possível que a vida na linha de pobreza seja passível de escolha.
'Could You Survive On The Breadline?' estreia nesta quarta-feira, 17 de novembro, às 20h30, na SBS e . Os episódios vão ao ar uma vez por semana, durante três semanas.
Assista o trailer: