Na última década, a população portuguesa residente no país, em vez de crescer, diminuiu: os portugueses em Portugal eram, em 2009, 10,6 milhões e baixaram em 2019 para 10,3 milhões.
Os dados da Pordata, base de dados do Portugal contemporâneo, apura a chave que explica a baixa: há uma perda de 530 mil pessoas no grupo etário entre os 25 e os 39 anos.
Esta população na idade de maior energia produtiva deixou o país, sobretudo, nos anos da grande crise 2011/2015, o tempo em que Portugal esteve submetido às regras de austeridade da troika internacional chamada para evitar a anunciada bancarrota.
Mas a receita de então foi terrível: a economia foi reestruturada, o país deixou de gastar mais do que o que produzia, houve financiamento mas a juros altíssimos e o desemprego cresceu até perto dos 17%. Os portugueses foram duramente penalizados. Houve quem acusasse os portugueses de preguiçosos. A acusação é desmentida pela realidade: em França como na Alemanha, os muitos migrantes portugueses são da mão de obra preferida, porque aplicada, diligente, competente. O problema que causou a rutura em Portugal no começo da última década foi a corrupção com pilar no sistema financeiro em sistema de cumplicidade com algum poder político.
É a corrupção que levou à extinção do grupo Espirito Santo, liderado pelo banco com o mesmo nome, com concessão de créditos colossais a amigos, sobretudo em Portugal e Angola. É nos próximos dias conhecida a acusação judicial que tem foco no líder do grupo, o ex-banqueiro Ricardo Salgado, que era conhecido como o DDT (dono disto tudo) e também no ex-primeiro-ministro José Sócrates. Ninguém duvida que eles são em grande parte responsáveis pelo descalabro financeiro que se tornou económico e social, resta saber se a justiça soube reunir as provas em modo consistente de credibilidade.
O facto é que nestes 10 anos, os impostos dos portugueses já serviram para desviar 17 mil milhões de euros para tapar buracos na banca.
Nos últimos 5 anos Portugal corrigiu os erros do passado imediatamente anterior. O país fechou o ano 2019 com, pela primeira vez no último meio século, com saldo positivo. Portugal gerou mais riqueza do que a que gastou.
Tem um Serviço Nacional de saúde e um modelo de Segurança Social que faz aumentar em contínuo o tempo médio de vida.
Apesar do decréscimo da população residente em Portugal, em 2019, havia quase mais 350 mil pessoas com 65 ou mais anos em Portugal do que há 10 anos.
As estimativas apontam para 15 milhões de portugueses atualmente: 10 milhões no país, cinco milhões a fazer comunidade pelo mundo.
Nos últimos 2 anos houve regresso de algumas dezenas de milhar dos que tinham partido nos primeiros 5 anos da década. Regressaram cerca de 50 mil. Tal como voltou a crescer muita migração, sobretudo da América do Sul, com o Brasil à cabeça. A restauração em Portugal tem como pilar o muito elogiado serviço de mesas brasileiro.
Agora, a pandemia, volta a precipitar tudo outra vez na crise.
Há uma diferença: o atual primeiro-ministro garante que não voltarão as medidas de austeridade. O Estado está a garantir a pontualidade dos salários, cobrindo layoff para evitar despedimentos. Isso implica nova dívida, mas que se espera em grande parte coberta pelo Fundo de Recuperação que a União Europeia deve aprovar no final da próxima semana.
Aliás, Portugal não perdeu tempo e já aí está o plano de relançamento que o governo encomendou a um perito, António Costa e Silva. Aponta prioridades estratégicas:
- Transformação de Portugal numa "fábrica da Europa" na Saúde, focando-se no desenvolvimento de dispositivos médicos, como ventiladores, e na criação de equipamentos de proteção individual, revendo os sistemas de certificação;
-Criação de “clusters” regionais em várias áreas, da floresta às ciências biomédicas, para desenvolver o interior do país e promover a descentralização;
- Criação de uma "grande Universidade do Atlântico" nos Açores, com um polo na Madeira, para o estudo do oceano, clima, terra e atmosfera, em cooperação com o ensino superior e centros de investigação
-Descentralização da Cultura pela criação de trabalho em rede e tendo como foco "as novas gerações, os talentos emergentes". Projetadas estão a criação de um fundo público para a criatividade digital e a instalação de "incubadoras para a criatividade e arte digital";
-Um pacto entre Estado e empresas para condicioná-las a gestão eficiente;
- Desenvolvimento de um centro de competências para a gestão de riscos naturais, assim como a investigação de soluções para combater a escassez da água;
-Criação de consórcios internacionais para explorar recursos nacionais, citando-se a necessidade de explorar minérios como lítio, cobalto, níquel, nióbio e tântalo, fundamentais à transição energética;
-Criação de habitação social em meios residenciais já existentes, para evitar a criação de guetos, e a contínua recuperação de património devoluto.
O plano também prevê grande investimento na infra-estrutura, designadamente nas ligações ferroviárias de qualidade, aposta forte nos portos desenvolvendo a noção de Portugal como porta portuária atlântica da Europa e ampla requalificação urbana.
Um plano com a ambição de que Portugal recupere aquele meio milhão que há 10 anos perdeu a esperança em Portugal e para que essa esperança possa ser mais de todos.
Por agora, ainda muita reocupação com a pandemia. Por um lado, porque há surtos que subsistem, sobretudo em população pobre, especialmente migrantes africanos que trabalham nas obras e não têm habitação digna. Por outro, o receio de uma nova vaga quando em outubro voltar o tempo frio.
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