Não é de se admirar que o aluno de doutorado brasileiro Weli Menário tenha escolhido a Austrália para estudar.
“Eu estudo o comportamento dos cangurus, então vou muito a campo e passo muito tempo estudando respostas a diferentes estímulos e então eu testo se os indivíduos têm personalidades diferentes, e também se o ambiente influencia nestas respostas".
Menario tem 27 anos e originalmente veio a Brisbane em 2013 para aprender inglês através de um programa de bolsas do governo brasileiro, o Ciência Sem Fronteira.
Quando teve que escolher um destino para continuar seus estudos, ele propositalmente escolheu um assunto que o obrigaria a voltar à Austrália.
“Eu sabia que a Austrália tinha bons programas para estudantes internacionais. Foi por causa disso que eu comecei a me candidatar por aqui, e eu realmente queria estudar o comportamento social de mamíferos, e a escolha óbvia na Austrália foi o canguru cinza-oriental."
Ele é um dos milhares de estudantes que chegaram à Austrália vindos da América Latina, encorajados pelo agora encerrado esquema de bolsas.
Por 4 anos até 2017, o número de estudantes latino-americanos quase dobrou, fazendo deste o grupo de estudantes estrangeiros que mais cresce, embora a partir de uma base pequena.
O Brasil é o maior mercado na região, com mais de 40 mil estudantes na Austrália, o que torna o país a quarta maior origem de estudantes no ano passado, depois de China, Índia e Nepal.
A Colômbia também cresceu no ranking, passando de 13º para o 9º maior mercado, com um aumento de 21%.
Há também um rápido crescimento nos números do Chile, 27% em 2017, e Argentina, 25%.
Apesar de a China representar um terço dos 32.4 bilhões de dólares movimentados pelo mercado de educação internacional, seu crescimento diminuiu e até caiu 1% na primeira metade deste ano.
O chefe da International Education Association, Phil Honeywood, diz que poucas pessoas no setor poderiam prever que Brasil e Colômbia estariam no top 10.
Ele atribui ao rápido crescimento às bolsas do Ciência Sem Fronteiras, que mandou mais de 100 mil estudantes ao exterior entre 2011 e 2015.
“O programa fez com que muitos jovens viessem para a Austrália pela primeira vez e, com a força do boca a boca, correu na América Latina a ideia de que a Austrália é um excelente lugar para estudar e passar um tempo. E isso impulsionou muito o crescimento que tivemos particularmente do Brasil, e depois a Colômbia."
Porém, os problemas econômicos forçaram o governo brasileiro a encerrar o programa de bolsas em 2017. E o setor de educação superior australiano investiga maneiras de manter a popularidade entre estudantes.
O governo nomeou um grupo de trabalho composto por representantes de institutos de educação e treinamento, pesquisa e negócios, incumbido de desenvolver uma estratégia de engajamento na região.
O grupo identificou seis países prioritários: Brasil, Colômbia, Chile, Argentina, México e Peru.
As críticas sobre a dependência em estudantes chineses adicionaram grande senso de urgência aos esforços para diversificar as matrículas de estudantes internacionais.
O CEO da English Australia, Brett Blacker, diz que, até agora, os maiores beneficiários do boom de estudantes latino-americanos foram as escolas de Inglês.
“Houve um aumento no comércio internacional em muitos países com indústrias estrangeiras que lideram os mercados de mineiração, agricultura e outros serviços, e a língua inglesa particularmente é vista como o principal fator para o crescimento econômico a longo prazo."
Mais da metade dos 50 mil estudantes latino-americanos que vieram à Austrália em 2017 estavam matriculados em cursos de inglês.
Blacker, que também coordena o grupo de trabalho do Conselho para a Educação para a América Latina, diz que o desafio é encorajar mais estudantes a prosseguirem os estudos na Austrália.
Em seu relatório de dezembro, o grupo de trabalho recomendou investimento adicional em marketing, parcerias entre instituições na região e também na Austrália, e desenvolver cursos de nicho para adequarem-se às necessidades da indústria nos países-alvo.
Phil Honeywood diz que existe apelo em formar parcerias de pesquisa e oferecer treinamento em áreas especializadas, como agricultura em terras secas, particularmente interessante a estudantes da Argentina, por exemplo.
A natureza e o estilo de vida australianos também são um bom cartão de visitas.
A bióloga brasileira Jéssica Fenker cursa seu doutorado na Universidade Nacional de Canberra em ecologia, evolução e conservação de lagartos.
“Vocês australianos realmente gostam de praticar hiking ou apreciar a natureza, e isso é o tipo de coisa que me identifico. E também é um lugar seguro, a segurança é um problema sério no Brasil e é bom poder andar por aí em segurança.”
Porém, as universidades não podem contar apenas com as belezas naturais australianas caso queiram mesmo capitalizar o boom de estudantes latino-americanos.
Phil Honeywood diz que, para se tornarem competitivos, eles precisam superar os maiores impedimentos: o alto valor dos cursos e do custo de vida.
A dificuldade que temos no mercado latino-americano é que os jovens de lá ainda podem voltar ao seu país de origem e obter educação superior gratuita ou ensino muito barato em relação ao que pagariam pelo ensino superior em um país como a Austrália”.
O grupo de trabalho recomendou às universidades e indústria que financiem mais bolsas.