Eles largaram tudo para viver em Bali

Marli dos Santos viveu em Sunshine Coast, mas prefere o estilo de vida mais modesto da ilha indonésia

Marli dos Santos viveu em Sunshine Coast, mas prefere o estilo de vida mais modesto da ilha indonésia. Source: Acervo pessoal

Contamos quatro histórias de brasileiros que passaram pela Austrália e foram em busca de algo mais na Ilha dos Deuses


A apenas três horas de voo de Darwin e quatro de Perth, Bali é um dos principais destinos turísticos para quem vive na Austrália.

É também um local adorado por brasileiros, residentes ou intercambistas, em especial por conta do surfe. Há quem tenha gostado tanto que por lá decidiu ficar.

A SBS em Português conversou com brasileiros que largaram a vida australiana para abraçar o estilo de vida mais simples e romântico balinês.

Quatro histórias diferentes que contam sobre as vantagens, as desvantagens, as alegrias e os perrengues de se viver na ilha dos Deuses.


Marli dos Santos viveu por meses na Sunshine Coast, em Queensland. Mas o fim de um relacionamento a fez procurar um destino mais espiritual, e encontrou em Bali o seu lugar.

"Sou mais feliz aqui, aqui eu sinto uma espiritualidade, uma coisa mais mágica. Não consegui sentir isso na Austrália. Aqui é um lugar pra ser feliz, não é um lugar pra ser milionário. Você pode até vir, se destacar e ganhar uma grana, mas eu vim aqui pra ser feliz".
Marli dos Santos: "Bali não é um destino para quem quer ficar rico"
Marli dos Santos: "Bali não é um destino para quem quer ficar rico" Source: Acervo pessoal
Marli paga as contas atuando como fotógrafa de surfe. O desapego ao dinheiro é fundamental para calibrar as expectativas de se viver na ilha, e assim ela consegue se manter com 6 milhões de rúpias ao mês -- o equivalente a 600 dólares.

"Aqui a gente tem uma vida boa porque o custo de vida é baixo. Você consegue ter uma vida bem mais legal sem ser escrava do sistema. Eu movimento uma grana de 6 milhões de rúpias ao mês (aproximandamente 600 dólares). (...) Vivo aqui uma vida modesta, sou feliz, como o que eu quero, visto o que quero, tenho meu carro. É uma vida modesta. São pessoas que quiserem ser mais felizes, trabalhar menos, ganhar menos."

Surfe, estilo de vida

Foi uma espécie de arrebatamento espiritual que fez a personal trainer Virginia de Moraes largar a vida que caminhava bem em Sydney para uma outra mais simples em Bali. E o surfe foi de paixão a ganha-pão.
Virginia de Moraes largou uma vida crescente em Sydney pelo surfe e pela espiritualidade de Bali.
Virginia de Moraes largou uma vida crescente em Sydney pelo surfe e pela espiritualidade de Bali. Source: Everto Luís/Acervo pessoal
"Em 2008, vim de férias por um mês, no último dia eu tava meditando na beira do clife. Quando acabei a meditação, abri os olhos, olhei pro sol, o sol se pondo no horizonte perfeito, senti um chamado. Esse é meu lugar, vem morar aqui. Voltei pra Austrália, em um mês tinha entregado meu apartamento, vendido meu carro, fechado meu business e vim pra cá. Pelo surfe, pela vida, pelas festas, por tudo que estava me oferecendo no momento, era tudo o que precisava. Foi super legal, fiquei três anos, de 2008 até 2012, fiquei só vivendo do dinheiro da Austrália. Foi uma época super interessante, conheci muita gente, surfei muito. Até que conheci meu marido Everton, fotógrafo de surfe. Ele vinha pra Indonésia, ficava 8 meses por ano, vinha à trabalho com as revistas da Brasil. Aí a gente resolve se assentar, comecei a ajudar a escrever matérias para as revistas juntos. Até que as revistas fecharam, o mercado de surfe ficou bem difícil. Então a gente resolveu abrir uma empresa de caixa-estanque, que são as caixas que você coloca a câmera dentro pra tirar foto de surfe. Nós abrimos a empresa aqui em 2016 e está indo super bem, a gente tem vários clientes brasileiros que ficam pra cá tanto tempo, seis ou oito meses por ano, e adoram nosso ramo. A gente agora é residente, tudo perfeito" .

Surfar e ajudar o próximo

O surfe também fez foi o elo inicial entre Sâmia Carolina e a ilha indonésia, mas em outro contexto: ela participava do Surf in the Nation, um projeto que junta faz surfistas percorrem locais com ondas incríveis ao mesmo tempo em que desenvolvem ações de caridade.

Ela conheceu uma região muito pobre da ilha e decidiu seguir sua vocação filantrópica.

"Quando cheguei aqui, fui para a ilha Nusa Lembongan, conheci a comunidade local, faziam plantação de alga marinha na praia. Comecei a pesquisar e vi que eles viviam com 100 dólares por mês pra família inteira, às vezes menos. Aquilo tocou meu coração e senti como se fosse um chamado de Deus mesmo. A gente viaja o muito inteiro, a gente fez projetos sociais no mundo inteiro, mas eu senti um desejo diferente ali, uma responsabilidade de ajudar aquela comunidade. Fiquei um mês e me programei de voltar pra lá. Conheci um americano que morava em Bali e fazia desenvolvimento com fazendeiros de Bali, ajudando na parte técnica, e conversou comigo. E o tipo de alga marinha que eles plantavam é o mesmo de uma alga que eles poderiam vender mais caras. Era só mudar o tipo, dobraria o salário deles. E comecei um projeto assim. Tudo a gente precisa de conhecimento, conhecer a língua, a cultura. Vir pra Indonésia como turista é totalmente diferente. Eu tive que conquistar a confiança daquele povo e ver se eles realmente gostaria de mudar. A gente é turista, tem que ganhar a credibilidade das pessoas. Fiquei três meses naquele período e aprendi a falar indonésio básico. Dava aula de inglês na vila e comecei a conquistar mais a confiança deles."

Depois de anos, o turismo acabou com as plantações de algas na ilha. E Samia procurou abrir o seu próprio negócio.

"Passou um período eu decidi comprar um barco nas ilhas de Padang, Sumatra, e desenvolver o turismo do surfe. Foi um grande desafio, (...) quando você abre um negócio fora do seu país, principalmente num país onde a corrupção e a insegurança é grande demais. A gente tem que aprender e continuar aprendendo. Aprendi que o lifestyle vale a pena, a gente não vai ficar milionário, que dinheiro não vale tanto, o que importa é estar aqui, surfar, e viver o sonho do surfista que é surfar nas ondas perfeitas."

O lugar ideal para curtir a aposentadoria

Mas há outras atrações em Bali que atraem os brasileiros além do surfe. É o caso de Luiz Lopes Gomes. Após a aposentadoria e divórcio no Brasil, foi ajudar na administração do hotel de seu cunhado em Darwin, North Territory.
Bali Luiz Lopes
Luiz Lopes e a a família: "Aqui tem um povo muito amável, até hoje nunca vi assalto, briga. Uma vida muito mais simples e tranquila." Source: Supplied
Bali virou um destino comum de férias. Após 7 anos, teve que deixar a Austrália em definitivo. Tinha 62 anos. Fã de cigarros e da boa vida, tinha amigos na ilha, e não teve dificuldades em escolher onde iria viver o resto de sua vida.

"Aqui é um povo muito amável, até hoje nunca vi assalto, briga. Uma vida muito mais simples e tranquila. Se você quer uma vida de aposentadoria, todos te respeitam independentemente da sua religião, aqui tem religiões de todos os tipos, é a chamada Ilha dos Deuses, hindus, islâmicos, católicos, protestantes, e um respeita o outro. Outra coisa é que muitos balineses fumam, eles respeitam e dão o direito. É muito comum restaurantes com áreas de fumantes. Aliás, tem restaurante que você pode fumar na própria mesa que você come, coisa que já não existe mais na Austrália. Algumas liberdades, você bebe na rua, na Austrália não é permitido. Você pode beber na praia. Essas liberdades fazem com que os turistas se sintam à vontade."

Hoje, aos 67 anos, Luiz vive feliz e tem uma parceira balinesa e uma filha de 1 ano.

Nem tudo são flores

Mas a vida em Bali não é fácil para quem está começando. Sâmia Carolina lembra que morar por lá exige certos esforços. E que não é possível esperar ter o padrão de vida da Austrália.

"A dica que eu dou é que você tem que vir e sentir a vibe. Passar tempos e pesquisar o que a pessoa gosta de fazer. Tem o ditado que diz, trabalhe com o que você gosta e você nunca mais vai precisar trabalhar... o que não é bem assim, mas cada um tem um chamado, um talento. Não é como a Austrália, que você vai pegar trabalho de faxineiro e vai viver com isso... aqui não existe isso. Camareira ganha coisa de 100 dólares por mês, e não vive, vivem com a família e comem arroz com pimenta. Você tem que empreender e gostar muito e saber o que é morar aqui, se não é muito melhor ficar na Austrália onde se ganha dinheiro, que se vive bem, ganha bem, e passa férias aqui."


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