Os idosos representam uma proporção considerável da população da Austrália - em 2017, mais de 1 em cada 7 pessoas tinha 65 anos ou mais. Cerca de 7% vivem em lares para idosos e locais que oferecem cuidados paliativos.
Para falar sobre o impacto do isolamento social nos idosos que vivem em lares na Austrália nós conversamos com a doutora Barbara Barbosa Neves, professora de sociologia da Universidade Monash em Melbourne e com Ypuã Pagangrizo, enfermeiro-chefe do Lar para Idosos Condare Court, que também trabalha no hospital St Vicents.
"Se antes da pandemia do coronavírus cerca de 40% dos idosos em lares na Austrália não recebiam qualquer visita, imagine agora que estão em quarentena e a entrada é proibida?" questiona a doutora Barbara, socióloga e autora de várias artigos sobre o assunto, incluindo O coronavírus é um desastre para os idosos que vivem em lares.Há seis anos pesquisado idosos que vivem em lares na Austrália e no Canadá, a doutora Barbara recolheu informações detalhadas de mais de 150 residentes.
Doutora e socióloga Barbara Neves: "Quem sofre de solidão sente-se isolado, excluído e abandonado, a solidão engloba sentimentos negativos combinados com a falta de ligação humana em um nível mais profundo" Source: Supplied
"Os idosos em lares já se sentem sozinhos normalmente. No entanto há sempre a esperança de que a família visite com mais frequência, que possam fazer mais amigos, nesse momento eles não têm qualquer esperança, o medo dos participantes do meu estudo é de que vão morrer sozinhos em isolamento."
"A sensação é de que agora não há nada mais a fazer, se antes já se sentiam isolados, já sentiam solidão, agora o medo é o fato de que a pandemia seja a última experiência que vão viver antes de morrer," diz Barbara.
Ypuã Pagangrizo, enfermeiro-chefe do Lar para Idosos Condare Court, em Melbourne, diz que a proibição das visitas, como parte das medidas de contenção do Covid-19, foi uma das medidas de maior impacto nos 65 idosos que vivem no lar.
"Percebemos que muitos idosos estão mais deprimidos, mais tristes, sentindo saudades da família, muitos se falam pelo telefone, alguns falam pelo facetime. Mas no geral está sendo muito difícil."
De acordo com dados da Bureau de Estatística da Austrália, em 2016, 1 em cada 3 idosos que vivem na Austrália nasceu no exterior; a maioria deles nasceu em um país que não fala inglês.Em seu estudo a doutora Barbara viu nuances étnicas no comportamento e atitudes diante da solidão.
Ypuã Pagangrizo, enfermeiro-chefe do Lar para Idosos Condare Court em Melbourne: "Estamos fazendo o máximo para suprir a falta dos amigos e familiares durante esse período de isolamento social" Source: Supplied
"No Canadá imigrantes chineses se mostraram mais vulneráveis à solidão. Sabemos que na Austrália na terceira idade encontramos grupos coesos de imigrantes que apóiam uns aos outros."
Para o enfermeiro Ypuã, do Lar Condare Court, os residentes italianos têm se mostrado mais vulneráveis ao isolamento social. "Eles estão mais acostumados com e sentem mais falta de contato humano."
O estigma associado ao envelhecimento e à solidão
Entre as principais descobertas do seu estudo a doutora Barbara ressalta o estigma associado à solidão e à velhice.
"Quando se sentem sozinhos os idosos não falam para a família por que já têm o estigma de serem velhos e não querem exigir muito da familia ou dos amigos. Pessoas idosas internalizam sentimentos negativos, e o que mais dói é não falar da solidão."
"A maior parte das famílias não acham que seus idosos sentem solidão e isso é errado, a maior parte dos meus participantes não dizem à família que sentem solidão."
Outro dado importante, resslatado pela socióloga, é que pesquisas mostram que a solidão aumenta em 40% o risco da demência nas pessoas idosas.
De acordo com o enfermeiro-chefe Ypuã, os residentes que têm um quadro de demência são o que mais apresentaram mudanças de comportamento no lar.
“Temos uma ala de residentes com demência que estão apresentando um comportamento cada vez mais difícil. Não estão vendo os cuidadores e familiares que costumam ver. Alguns deles estão mais violentos, tem sido muito difícil administrar essa situação tanto para os idosos quando para os profissionais da área de saúde, “ diz.
Sentir-se sozinho mesmo rodeado de pessoas
Uma das perguntas a doutora Barbara recebe com frequência é sobre como os idosos se sentem sozinhos em lares quando estão rodeados de outros residentes, funcionários, enfermeiros e, para alguns, familiares.
"Eu sempre digo que a questão não é a quantidade mas qualidade das relações humanas, uma ligação forte e sincera de amizade leva tempo para ser estabelecida."
Segundo ela novas tecnologias, applicativos, robôs e realidade virtual podem ajudar a abrir novas oportunidades para relacionamentos sociais com a família e com os amigos. "Temos que estudar não só a aficiência mas a qualidade dessas relações."
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O estudo de Barbara Barbosa Neves, Alexandra Sanders e Renata Kokanovic foi publicado no Journal of Aging Studies.
As pessoas na Austrália devem ficar pelo menos a um metro e meio de distância dos outros e encontros estão limitados a duas pessoas, a não ser que esteja com a sua família ou em casa.
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