Há 10 dias, as notícias davam conta da aproximação pela zona central de Moçambique de um ciclone, acompanhado de fortes chuvas e ventos de 170 kms por hora. As horas seguintes mostraram que as piores previsões seriam superadas pela realidade.
Imagens terríveis, de gente em cima de árvores ou outros pontos altos, cercada por água mortal, doenças, crocodilos. Crianças a beberem a água castanha que não pode ser bebida.
Foram precisos dias para perceber a dimensão dos problemas e a contagem continua longe do fim.
O ciclone Idai transformou a Beira numa zona de catástrofe. Mais de mil e 300 quilómetros quadrados de terra que ficou submersa e que agora está devastada.
Aquela região de África costuma ser fustigada por ciclones nesta época do ano, entre janeiro e março, porque a água do mar aquece no verão, alimentando as tempestades. O que foi impressionante foi a destruição que este ciclone provocou. Idai matou centenas (talvez milhares) de pessoas e destruiu também milhares de infraestruturas. Pode mesmo ter sido o fenómeno natural mais destruidor do hemisfério sul. E o motivo é o seu estranho e raro “comportamento errático”.
Os ciclones na região formam-se no Oceano Índico. Todos os anos há um ou outro ciclone a nascer assim. Depois podem acontecer quatro coisas: a tempestade pode dispersar-se antes de encontrar terra; passar a norte de Madagáscar; aterrar nesse país mas dissipar-se porque perde força; ou então atravessar Madagáscar e entrar no canal de Moçambique. No caso do ciclone Idai, o percurso foi este último. E foi devastador.
O ciclone Idai fez ainda uma outra coisa rara: um circuito em U, ou seja, entrou duas vezes em terra. A primeira vez foi a 4 de março, quando matou 66 pessoas e feriu outras 111. Nessa altura contabilizaram-se quase seis mil casas destruídas, 15 mil edifícios afetados e 168 mil hectares de terras de cultivo inundadas. Depois voltou para dentro do mar, onde se alimentou das altas temperaturas da água. Só regressou 11 dias depois, a 15 de março. E aí estava tão mais poderoso que o governo estimou que tenha causado a morte de um número ainda por contar de pessoas.
A Cruz Vermelha diz que a destruição atingiu 90% da região. Como se os números não bastassem, há histórias que impressionam: mães que resistiram com água pela cintura mais de 24 horas, com os bebés nas mãos, a erguê-los, para que não fossem levados pela corrente.
Há quem compare com o tsunami no Índico, em 2004. As árvores todas caídas, pessoas mortas pelo caminho, corpos a boiar. Postes de electricidade caídos, casas só paredes, e outras sem paredes, abalroadas pela cheia.
Aldeias e vilas engolidas pelas águas. Sobreviventes, às dezenas, em telhados durante vários dias sem água ou qualquer tipo de assistência.
Há enchentes nas casas mortuárias. As famílias estão a ser obrigadas a ficar com os entes queridos falecidos. E no berçário do Hospital Central muitos bebés e mães perderam a vida.
O “pior desastre natural de sempre a atingir o hemisfério sul”, na definição das Nações Unidas, está a contar com apoio e ajuda portuguesa na mesma proporção em que se foi conhecendo a dimensão dos problemas.
Neste momento, há aviões diário que partem de Lisboa para Moçambique com socorro em peritos em catástrofe e com abastecimentos.
Já foram brigadas especiais de fuzileiros com zebros de borracha, foram bombeiros treinados para resgates em meio aquático, foram médicos e enfermeiros. Foram binómios cinotécnicos com militares e cães treinados na busca de sinais de vida. Também foram equipas de medicina legal.
Sabe-se que a seguir vem aí a malária, as febres e as diarreias.
A água potável começa a chegar, a energia elétrica também. Mas tudo demorou mais de uma semana.
Numa catástrofe como esta, cada minuto conta, e a responsabilidade da resposta portuguesa é principal, entre todos os países estrangeiros.
Portugal está mobilizado, o país mobilizou a União Europeia e a CPLP também está a responder, a par das diferentes agencias da ONU.