"A Austrália é um dos melhores lugares para empreender"

Paula Mills: "O brasileiro se vira, é ágil, fala com paixão, encontra soluções rápidas. No Brasil, empreendedorismo é uma técnica de sobrevivência"

Paula Mills: "O brasileiro se vira, é ágil, fala com paixão, encontra soluções rápidas. No Brasil, empreendedorismo é uma técnica de sobrevivência" Source: Paula Mills/arquivo pessoal

A empresária Paula Mills, primeira brasileira a ganhar o prêmio de Excelência Empresarial do Conselho Empresarial Austrália-América Latina, dá dicas para quem pretende tentar a sorte no país


A empreendedora Paula Mills é a primeira pessoa de origem brasileira a ganhar o prêmio de Excelência Empresarial do ALABC, o Conselho Empresarial Austrália-América Latina. Ela é co-fundadora da Academy of Entrepreneurs, em Sydney, que promove o empreendedorismo a quem está começando a vida na Austrália.

De personalidade elétrica, Paula Mills chegou ao país há 14 anos, quando tinha apenas 18. Cursou três faculdades e desde o início entendeu o mundo dos negócios no país. Nesta conversa com a SBS em Português, ela dá dicas sobre como empreender no mercado australiano, ressalta o despojamento que o brasileiro traz do berço e afirma: não há país no mundo para se empreender como a Austrália.

SBS: que você sentiu quando seu nome foi anunciado?
Paula Mills: Super emoção, mas muita gratitude à comunidade brasileira e da América Latina. Não seria possível sem a ajuda de todo mundo, e tive tanta ajuda de empreendedores da América Latina. Foi incrível. Então o prêmio é de toda a América Latina.

SBS: Você é a primeira pessoa do Brasil a ganhar esse prêmio. O que explica o Brasil demorar tanto a integrar essa lista de premiados da América Latina?
Paula Mills: Não sei, mas vamos mudar. Fiquei impressionada quando me disseram que eu era a primeira, porque a comunidade brasileira está entre as top 5 das que mais vêm para a Austrália, então não faz sentido. Meu sonho é que no ano que vem tenhamos outro brasileiro ganhando. Por favor, vamos. E quem quiser ajuda, me avise, estou aí para ajudar.

SBS: O Alabac recém-celebrou seus 30 anos de existência. Foi um jantar de gala, não foi isso?
Paula Mills: Foi maravilhoso. A gente teve vários cônsules, embaixadores, representante de 20 países da América Latina. Tivemos três prêmios, com 100% dos votos, de todos os julgadores. Parece que foi a primeira vez que acontece.

SBS: E qual é o trabalho que você fez?
Paula Mills: A gente ganhou pelo projeto de educar estudantes da América Latina a empreender aqui na Austrália. E a gente recém-lançou o projeto também no Brasil, Colõmbia e México. Jogamos pelos dois lados, estamos ensinando aos jogos que eles não precisam ficar no emprego, que eles podem criar o próprio emprego, ter um impacto na sociedade. E, se você quer ficar na empresa que você ama, você tem que trazer inovação todos os dias, independentemente do tempo de empresa ou do cargo que você ocupa. A gente ganhou o prêmio por educar a sociedade a lutar e conquistar e trazer inovação a todos os cargos e empresas do mundo.

SBS: Educar os estudantes a serem empreendedores na Austrália é a primeira fase, e depois de fato se tornarem empreendedores. Houve muitos exemplos?
Paula Mills: Sim, dentro da Academy of Entrepreneurs, 250 casos de estudantes da América Latina que nos últimos três anos abriram o próprio negócio aqui em Sydney, sem contar as pessoas que pelo Instagram ou Facebook participam de nossos eventos online. A gente recebe mensagens diariamente falando que eles estão empreendendo em outras cidades. Eu até fui convidada há duas semanas a ir até Perth para apresentrar à comunidade. Havia 150 brasileiros que já estavam empreendendo e queriam crescer o próprio negócio, e a gente foi lá dar dicas de como eles podem fazer isso. Foi maravilhoso. A comunidade brasileira está crescendo muito rapidamente em empreendimento. Super orgulho.

SBS: Os estudantes que estão aqui com visto de estudante e acabam abrindo o próprio negócio... Isso pode abrir caminho para se tornarem residentes permanentes?
Paula Mills: Há excelentes oportunidades, a Austrália é um dos poucos países do mundo que permitem estudantes trabalhar, estudar e empreender. Então o aluno pode empreender desde o primeiro dia de seu curso e não tem limite de dinheiro e lucro ou nicho. Então ele pode ser um engenheiro e abrir um hospital desde o primeiro dia de seu curso. Não tem limite. Daí a parte da pontuação depende muito do que o aluno fazia antes. Recomendo falar com o agente migratório, caso a caso. Depende da idade, do nível de inglês, quantos anos de experiência, em que é formado no Brasil. E há 5 pontos de alunos que são formados com a gente, estamos tendo alunos que estão pegando residência através dos pontos extra de nossos cursos. É uma combinação de vários casos mas que tem que ser feita caso a caso. Você pode ser formado em engenharia na mesma universidade, ou chef de cozinha ou cabelereiro, e dependendo da idade ou anos de experiência você somará pontos diferentes. Então é sempre recomendado falar com agente de migração, mas, por experiência, e já trabalho nessa área há 13 anos na Austrália, quem faz o que ama, brilha, tem sucesso e consegue encontrar algum visto. Só tem que lutar e não desistir, dar o seu máximo. Tudo é possível aqui na Austrália, é um dos países com maiores oportunidades no mundo para a área de empreendimentos.

SBS: Um pouco da sua história pessoal. Como você chegou na Austrália?
Paula Mills: Eu cheguei pelo trabalho do meu pai. Ele era um engenheiro que abriu várias fábricas na África do Sul, no México, na China, e o primeiro-ministro da Austrália há 14 anos, o Jown Howard, ficou sabendo do meu pai e ele desenvolveu a tecnologia do etanol do Brasil pra dentro dos postos de combustível aqui da Austrália. A gente chegou com um projeto diferente, eu não vim como estudante internacional. Eu já tinha muita experiência de trabalho e acabei abrindo uma agência de relações públicas para a comunidade. E nisso vi o gap de muitas pessoas que queriam empreender e não sobreviviam, e estudantes que procuravam emprego e não conseguiam. Pensei, calma aí, não faz sentido, vamos conectar o estudante com empreendimentos e empreendedores. E foi aí que surgiu a ideia da Academy of Entrepreneurs. Esse é o resumo de uma história muito longa.

SBS: Que idade você tinha quando chegou na Austrália?
Paula Mills: 18 anos.

SBS: Então você fez sua formação aqui.
Paula Mills: Sim, fiz três universidades aqui. Por vontade, eu não precisava pelo visto, mas sempre amei empreender e conhecer novas pessoas. E o sucesso de todas as empresas que eu tive aqui na Austrália foi graças ao networking. E isso é uma coisa muito importante para o brasileiro se jogar, a gente tem muita hierarquia, então dependendendo muito do seu sobrenome, de quantos anos de empresa eles valorizam ou não. Aqui na Austrália não funciona assim, todo mundo tem uma oportunidade. Comecei a empreender mexendo com projetos de governo com 18 anos de idade e todo mundo me dava chance, não é porque tinha 18 anos e era uma mulher que iriam me considerar ou não. Eles davam oportunidades para os melhores projetos. E eu amaria ver mais brasileiros tentando, porque eles acham que brasileiros às vezes colocam na cabeça "ai, não tenho fluência no inglês, ou tenho sotaque". Não tem nada a ver. Se você é bom no que faz, a Austrália tem mais oportunidade que qualquer outro país. É muito importante os brasileiros se jogarem e fazerem amizade em todas as indústrias, com todas as nacionalidades para encontrar o sucesso empresarial.

SBS: O que você estudou nestes três cursos na universidade?
Paula Mills: Mídia, e depois Relações Públicas e Relações Internacionais.

SBS: Todos servem para o que você faz hoje.
Paula Mills: Exato, sempre tive um foco em comunidade, impacto social, os três ajudaram muito, desde social media até desenvolver networking, desenvolver projetos com impacto na sociedade e entender o que é sociedade. É isso que as pessoas às vezes erram. Empreender é solucionar um problema através do empreendimento, com seu serviço e seu produto.

SBS: Há negócios que dão certo e há negócios que quebram. Quais as razões que fazem as pessoas empreenderem e não dar certo?
Paula Mills: Primeiro ponto é sempre a inteligência emocional. Se você não se conhece e não conhece o que você faz bem, você nunca vai conseguir sobreviver dentro dessa empresa. Você é bom de relações públicas, de marketing, de finanças, você não precisa ser a pessoa mais falante do mundo e estar fazendo as vendas da sua empresa. Você pode ser a pessoa técnica que tem um aplicativo. E é isso que as pessoas esquecem, acham que têm que fazer um pouquinho de tudo, não desenvolvem nada das suas grandes qualidades e não passam trabalho para sua equipe. Querem somar tudo para cortar gastos ou pelos riscos e acabam afundando a empresa. O empreendedor tem que se desenvolver todos os dias na área em que atuam bem, e ter a equipe que pode colaborar. O segundo é equipe, entender o tamanho da equipe, como você vai administrar, quais são os goals e os projetos envolvidos, e sempre inovar, todos os dias. Olha o seu business model e pensa, "se eu fosse o Steve Jobs, a Google, Amazon, como eu sobreviveria? Como eu inovaria meu produto, meu serviço? Sempre inovando, e inovar não significa gastar muito dinheiro com tecnologia. É só ter uma ideia e ver maneiras diferentes de comunicar, de inovar, de oferecer serviços ao cliente.

SBS: Quais são as prioridades para sua empresa em 2020?
Paula Mills: A gente vê que cresce cada vez mais a área de empreendedorismo social. Inclusive a gente acabou de lançar uma área de social entrepreneurship. 87% dos consumidores hoje em dia preferem comprar um produto de uma empresa que faça alguma coisa para a sociedade, seja caridade, doação ou alguma coisa sustentável. Então a geração que representa 62% das gerações de trabalho não quer trabalhar, não quer consumir nenhum produto que não tenha nenhum impacto na sociedade. É um ponto muito importante. Todo mundo tem que incluir isso nos valores, na missão da sua empresa. Qual o impacto que você vai ter na sociedade? Como vai contribuir? O consumidor procura muito isso e hoje em dia a gente sabe que o consumidor é dono da nossa marca. Eles que vão dar as estrelinhas no Instragram e vão trazer mais clientes pra gente. Por mais que tenhamos todo dinheiro para marketing, o consumidor é dono da nossa marca. Então empreendedorismo social é uma coisa maravilhosa que finalmente faz parte do empreedimento comercial.

SBS: Você falando sobre empreendedorismo social soa como empreendedorismo ambiental.
Paula Mills: É, pra todas as áreas de comunidade, de leitura, de alimentação, de saúde. Pode ser coisas simples como restaurantes e cafés que têm tudo biodegradável, ou uma empresa de tênis americana inspirada por um projeto na Argentina onde você compra um tênis e você doa outro para uma criança em outro lugar. A Zamprero, uma empresa de comida aqui da Austrália, quando você compra um sanduíche, você está alimentando uma pessoa no México. É esse tipo de impacto, o one for one que a gente fala.

SBS: Quem mais ganhou os prêmios da ALABC?
Paula Mills: Teve uma empresa de energia e outra uma pequenininha de tecnologia que conseguiu 15 clientes a 2.5 milhões de dólares de lucro extra para este ano. Então é muito legal para a gente ver como essas empresas estão crescendo aqui.

SBS: E você que acompanha a comunidade empresarial brasileira, o pessoal que está chegando e entrando, qual a sensação que você tem das instituições australianas, do governo, da imigração em relação ao perfil de um brasileiro?
Paula Mills: As leis da Austrália estão cada vez mais flexíveis, dando mais apoio ao empreendimento. Impostos mais fáceis, de registros de impostos, pegar informação na Internet. O governo faz centenas de eventos por mês de graça pra dar suporte para a comunidade. Uma coisa maravilhosa do governo é que doa muito dinheiro para pessoas que estão solucionando problemas que o governo não tem solução para problemas. Auxílios para projetos. Ele não fica com nenhuma porcentagem da sua empresa e pra isso você não precisa nem de visto de estudante. Pode até ser visto de turista pra ter acesso a alguns desses.

SBS: Você acha que o brasileiro tem um perfil bom, comparando com outras comunidades?
Paula Mills: Com certeza. O brasileiro se vira, é ágil, fala com paixão, encontra soluções muito rápidas. No Brasil sempre se diz que empreendedorismo é uma técnica de sobrevivência. E no Brasil a gente já passou por tantas transformações nos últimos 50 anos que a gente já tem no nosso DNA que não vai desistir, e isso é o que o investidor, o consumidor busca, um líder que não desista. O brasileiro já tem isso no DNA.

 


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